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segunda-feira, 2 de maio de 2011

A REVOLUÇÃO DA INFORMAÇÃO E AS CIDADES 2ª A

INFORMAÇÃO, CIDADE E CONHECIMENTO:
POR UMA ABORDAGEM DO ESPAÇO URBANO



SILVIO JOSÉ CONCEIÇÃO*

gropius@uol.com.br



Trata-se de uma abordagem informacional das redes urbanas na construção do conhecimento na/da cidade, passando pela apropriação/apreensão do espaço através de cenários virtuais-informacionais, instituídos num certo lugar, com intenções e desejos variados, decodificados e reapreendidos num lugar outro, (re)significados a partir de uma certa unidade espaço-temporal, cada vez mais diluída e tênue pelo recurso da própria velocidade, e que aqui nos parecem vindas do lugar algum, produzidas por ninguém, e sem qualquer intencionalidade presente em sua (di)fusão. Propomos alguns mergulhos neste universo da informação-matéria-imaginação, abordando a materialidade da informação-imaginação, a imaginação da matéria-informação, e também a informatiCidade da matéria-imaginação. Queremos mergulhar nas tensões desta convivência múltipla, na diversidade e complexidade da coisa-sendo (constituinte e instituinte de relações) e também na multirreferencialidade do espaço, para uma compreensão da vida na e da cidade, na construção do conhecimento, do saber e da informação na rede urbana. Este ensaio propõe uma visão em rede do objeto cidade a partir de reflexões acerca dos fluxos de informação ger(i)(a)dos no espaço urbano como possibilidade para a construção do conhecimento. Observamos os vários percursos da informação e do conhecimento na cidade sob o ponto de vista dos seus aspectos físicos e relacionais como instituidores de redes informacionais.


Palavras-chave: cidade, informação, conhecimento, redes de informação, espaço urbano.

INFORMAÇÃO, CIDADE E CONHECIMENTO



Embrenhei-me num deserto de areia: avançava afundando entre dunas de certa forma sempre diversas umas das outras e no entanto quase iguais. Conforme o ponto do qual fossem olhadas, as cristas das dunas pareciam relevos de corpos estendidos. Aqui parecia modelar-se um braço inclinado sobre um terno seio, com a palma estirando-se sobre uma face reclinada; além parecia surgir de um jovem pé de airosos artelhos. Parado a observar aquelas possíveis analogias, deixei transcorrer um bom minuto antes de me dar conta de que sob meus olhos não tinha um crinal de areia, mas o objeto de minha perseguição

Italo Calvino

Cosmicômicas, 1992.



As abordagens sobre o espaço urbano são realizadas, em grande parte, com enfoque nos fatores físicos, arquitetônicos ou formais da cidade, ou nos fatores econômicos, sociais e culturais individualmente, havendo quase sempre a mutilação de alguns fatores importantes para a compreensão urbana, como por exemplo, os aspectos relacionais entre os elementos/fragmentos urbanos. O que pretendo com este ensaio é a construção de percursos que articulem as redes urbanas e suas questões (Castells), os espaços de fluxos de Milton Santos e a emergência em sistemas auto-organizados de Steven Johnson.

Pleiteamos para os estudos urbanos, em conjunto com as teorias da complexidade, a compreensão dos fenômenos do espaço-cidade a partir (também) das relações estabelecidas e estabelecentes da produção do conhecimento e da informação. Entendemos (também) a cidade como espaço de fluxos, e não apenas em sua configuração físico-espacial, ela é produto e produtora de complexidades que se apresentam nos indivíduos/ grupos e nas articulações/ produções das atividades humanas, onde configuram e constróem o espaço. A cidade aqui é entendida na diversidade de sua constituição, nos movimentos e dinâmicas dos seus elementos/ artefatos formadores, com atenção especial para as relações criadas e estabelecidas entre eles.

O espaço deve ser considerado como um conjunto de relações realizadas através de funções e de formas que se apresentam como testemunho de uma história escrita por processos do passado e do presente. Isto é, o espaço se define como um conjunto de formas representativas de relações sociais do passado e do presente e por uma estrutura representada por relações sociais que estão acontecendo diante dos nossos olhos e que se manifestam através de processos e funções. O espaço é, então, um verdadeiro campo de forças cuja aceleração é desigual. Daí porque a evolução espacial não se faz de forma idêntica em todos os lugares.

Mais uma vez aqui a noção de relatividade produzida por Einstein aparece como fundamental porque substitui o conceito de matéria pelo conceito de campo, o que supõe a existência de relações entre a matéria e a energia. Numa comparação talvez grosseira, as formas seriam comparáveis à matéria e a energia à dinâmica social. (Santos, 2002a. p.153)

CIDADES E REDES

Tratar a cidade num sistema em rede é uma forma de potencializar seus espaços e aqueles gerados a partir de suas articulações. E para isso é importante o entendimento das lógicas de funcionamento que conectam várias atividades/ações/objetos em seus fluxos. Redes de dados, redes de informações, redes de tráfego, redes de produção de conhecimento, redes de comunicação. São várias, e não basta listá-las. Mais importante é tentar conhecer seus princípios. Steven Johnson fala de sistemas auto-organizados em comunidades de formigas, em redes de softwares, no cérebro, e também em cidades. Neste último caso ele retoma algumas considerações de Jane Jacobs, que em seu livro Morte e vida de grandes cidades (1961) fala dos ‘olhos das ruas’, e da apropriação do espaço pelos nova-iorquinos. Os estudos sobre as comunidades de formigas ‘destruíram’ o mito da supremacia da ‘formiga-rainha’. Não existe a formiga-líder, e mesmo assim, o sistema funciona. Johnson ainda cita algumas propostas de softwares que tentam abrigar em sua arquitetura, estruturas auto-organizadas, ao que ele chama de softwares inteligentes, e que a partir do uso e dos conceitos construídos pelos usuários de forma não hierárquica o sistema vai ajustando-se a cada grupo de usuários, que por sua vez, interagem em rede.

O mesmo acontece com o espaço urbano, que à revelia de planos diretores de ocupação do solo, criam espaços especializados em alguns tipos de serviço/atividade ou grupo social. São bairros ou regiões da cidade que concentram empresas de comércio de auto-peças, de papelarias, roupas masculinas, roupas infantis, material esportivo, e assim por diante. Ou seja, existe uma organização que pulsa fora dos sistemas hierárquicos, e isto é uma lição da cidade para as abordagens urbanas.

No nosso caso, o termo abordagem pode ser entendido no sentido dado pela ciência: tratar de, versar sobre algum tema, como também em sentido originário, que vem de borda, estar na borda de algo, ou ainda no sentido de aproximação de uma embarcação para tomá-la de assalto. Estamos tentando uma aproximação com as embarcações da informação e do conhecimento para, nestes cenários e territórios, tratarmos das questões urbanas, que muito têm dos fluxos de informação e conhecimento.

Conhecimento e informação entendidos no sentido da apreensão do espaço e do conhecimento gerado a partir destas dinâmicas, como também de outros modos de produção de conhecimento que acontecem nos espaços urbanos. É importante atentarmos para o espaço urbano também nos seus aspectos físicos, pois é nele que as práticas urbanas acontecem, reconstruindo os sentidos de espaço, como também as lógicas das próprias práticas. São necessárias algumas aberturas nos conceitos de espaço-urbano para que este seja entendido nos aspectos físicos, nas práticas e produções cotidianas, e também nas dinâmicas das práticas nos espaços e dos espaços de práticas.


INFORMAÇÃO, CONHECIMENTO E REDES

Os caminhos da informação e do conhecimento, como também os caminhos na cidade podem parecer aleatórios, produzidos por ninguém, ou definidos segundo o acaso, ou o seu inverso – imposto pelos detentores/operadores do poder da informação e do conhecimento. Mas creio que eles são em grande parte, fruto dos desejos e aspirações de grupos-indivíduos, mesmo que originalmente não tenham sido os ‘pais’ dos ‘modos urbanos’, eles modificam e constróem o sistema à medida em que se apropriam dos espaços, lugares e lógicas. É preciso invocar e compreender os sistemas auto organizados estudados por Prigogine, tomá-los de assalto (e por que não?) para que então possamos estabelecer conexões entre os sistemas de fluxos de informação, conhecimento e pessoas na rede urbana.

Evocamos a informação, o conhecimento e a cidade com o intuito de articular o espaço urbano em suas várias dimensões e referências. Os espaços de fluxos, a circulação da informação, a construção do conhecimento e a capacidade de múltiplas dinâmicas do espaço urbano e da cidade são possibilidades de ligação entre estes campos para a compreensão do que podemos entender como matéria, imaginação e informação. A velocidade da comunicação, a grande capacidade de disseminação da informação pelos meios eletrônicos e de alta tecnologia podem levar aos ‘usuários’, a sensação de não-identidade das fontes da informação. Enquanto em outros meios, poderíamos identificar os autores e produtores da informação, o que observamos hoje é a difusão de páginas na rede mundial que propagam informações aparentemente despersonalizadas. Não que haja algum problema com a disseminação impessoal, apenas não creio que seja verídica esta possibilidade, pois nós produzimos, disseminamos e consumimos a informação, e ao fazermos qualquer um destes ‘passos’, a transformamos.

A questão fundamental aqui é o funcionamento dos sistemas em rede - redes de informação/ pensamento, através do imaginário instituinte da sociedade como aponta Castoriadis, ou da auto-organização dos sistemas emergentes de Steven Johnson.

Neste sentido, é importante a compreensão dos sentidos que articulam questões aparentemente tão distantes. Este, é já um exercício em rede. A propagação ou disseminação da informação na internet, como também nas cidades, acontecem pelas redes relacionais de informação. Redes estas, formadas pelos indivíduos e instituições na produção e espraiamento do objeto-informação. Por outro lado, temos a cidade e sua organização espacial que está ligada às questões econômicas, sociais, sociais e históricas, mas que funcionam como se houvesse algum maestro regendo a orquestra, mesmo que em determinados momentos ela desafine, perca o tom ou compasso. Este maestro não existe. A força da organização é a convivência negociada e ao mesmo tempo, tensional, dos atores sociais, na definição dos espaços de convivência. Podemos pensar numa espécie de ‘consciência’ social, que surge das vivências individuais e da aproximação com o ‘outro’ para a criação de ‘novos’ modos de vida e apreensão social. Novo, no sentido das modificações/ construções e transformações durante o processo de aprendizagem do espaço.

Na organização da cidade, Johnson fala de emergência, no ‘caminhar’ da sociedade, Castoriadis trata do imaginário instituinte, e Castells sobre o espaço urbano, trata da sociedade em rede. Observo nos ‘sistemas’ adotados e pesquisados por estes autores alguma coisa em comum, que é a produção de informação na cidade-sociedade e também de criação/produção de conhecimento na/da sociedade sobre/com o espaço urbano. Informação e conhecimento como articulação dos sistemas emergentes de auto-organização.

Há objetivos explícitos para uma cidade – razões de ser que normalmente seus cidadãos conhecem, decorrentes da proteção proporcionada pela cidade murada ou do comércio livre nos mercados. No entanto, as cidades também têm um objetivo latente: funcionar como mecanismos de armazenamento e recuperação de informações. As cidades criaram interfaces amigáveis milhares de anos antes que alguém sonhasse com computadores digitais. As cidades juntam mentes semelhantes e as colocam em escaninhos conexo. Sapateiros junto de outros sapateiros e fabricantes de botões perto de outros fabricantes de botões. Idéias e mercadorias fluem rapidamente nesses conjuntos, levando à produtiva polinização cruzada, garantindo que boas idéias não morram em áreas rurais isoladas. (Johnson, 2003. p.79)

Johnson, através da ‘emergência’ faz conexões da dinâmica de rede no funcionamento do cérebro, na organização das formigas, nos sistemas urbanos e nos softwares. Esta construção-contribuição permite vislumbrar algumas ‘viagens’ da informação por estes sistemas, e ainda a possibilidade de um conhecimento construente e coletivo. Podemos observar que os sistemas funcionam de modo articulado, e não estanque. Percebe-se um componente coletivo, ou imaginário instituinte na cidade, como também no próprio indivíduo-cérebro. São redes e grupos que trabalham articulando-se com outras redes e grupos.

Sob todos os aspectos, estamos no meio de outra revolução tecnológica – a idade da informação, uma época de conexões quase infinitas. Se o armazenamento e a recuperação de informação eram objetivo latente na explosão urbana da Idade Média, eles são os propósitos evidentes da revolução digital. Isso nos leva à seguinte questão: a Web também está aprendendo? Se é fato que as cidades podem gerar inteligência emergente – um macrocomportamento provocado por milhões de micromotivos -, que forma de nível mais alto está sendo gerada entre os roteadores e os cabos de fibra ótica da Internet? (idem. p.83)

Trata-se de auto-organização. As possibilidades do empreendimento da circulação de informação e construção de conhecimento tem seu potencial ampliado pelas redes informacionais de comunicação. Steven Johnson sugere para um melhor entendimento dos sistemas, a substituição das formigas por neurônios e do feromônio (deixado e seguido pelas formigas) por neurotransmissores como analogia da aprendizagem em formigas, no cérebro e quem sabe na Web, através da conexão dos vários cérebros em rede, o que permitiria ao sistema virtual, um comportamento de vizinhança, embora existam deslocamentos/ distanciamentos espaciais.

O que parece interessante é a capacidade de nossas mentes do reconhecimento da mente do outro; as formigas, pelo rastro de feromônio acumulam alimentos, ou limpam os detritos; as cidades aprendem as funções pela história de suas populações. Acho que isto poderia ser a ‘grande consciência’ que abrange os micromotivos e microcomportamentos ou a instituição imaginária da sociedade, na qual Castoriadis trata da imaginação, relacionando este termo com a imagem, em seu sentido mais geral e também com a idéia de criação:

[...] Não cria “imagens” no sentido habitual (ainda que as crie, também: marcos totêmicos, bandeiras, brasões, etc.), porém formas, que podem ser imagens no sentido geral (assim, falamos de “imagem acústica” de uma palavra), mas que são, de modo central, significações e instituições, as duas sempre solidárias. O termo ‘imaginário’ é aqui um substantivo, e se refere diretamente a uma substância: não é um adjetivo denotando uma qualidade. (1999. p.242)

Assim, trata-se de uma forma de conexão entre a imaginação e a matéria em sua ‘substância’. A imaginação na sociedade, como possibilidade de organização das ações e pensamentos conjuntos, tem implicações materiais e informacionais. A matéria, a imaginação e a informação andam juntas, e diria mais: não podemos facilmente separá-las. Conceber a informação sem o caráter de criação que imaginação pode dar, ou da materialidade da substância fluida é difícil: seria mutilação de sentidos e propósitos. Quero com isso, tratar das articulações entre estas grandezas, se assim podemos chamá-las, para que o pensamento sobre as práticas cotidianas no espaço urbano (assim, como o da circulação da informação pelas várias mídias) não seja a interpretação individualizada ou puramente hierárquica. Existe um componente coletivo e social que dão múltiplos sentidos, quer sobre o território, quer nas vias de transporte da informação. A informação toma o caráter de objeto e imaginação, produtora de diversidades, presente na organização sócio-espacial.


ESPAÇO DE FLUXOS

Milton Santos afirma que o espaço não é estático ou estanque, é fluido, ambiente de fluxos e velocidades:

Hoje, vivemos um mundo da rapidez e da fluidez. Trata-se de uma fluidez virtual, possível pela presença dos novos sistemas técnicos, sobretudo os sistemas da informação, e de uma fluidez efetiva, realizada quando essa fluidez potencial é utilizada no exercício da ação, pelas empresas e instituições hegemônicas. A fluidez potencial aparece no imaginário e na ideologia como se fosse um bem comum, uma fluidez para todos, quando, na verdade, apenas alguns agentes têm a possibilidade de utilizá-la, tornando-se, desse modo, os detentores efetivos da velocidade. O exercício desta é, pois, o resultado das disponibilidades materiais e técnicas existentes e das possibilidades de ação.(2002b. p.83)

O espaço, através da fluidez e rapidez adquire sentidos outros que o diferem do caráter determinista de outrora; o espaço dos fluxos e os fluxos do espaço estão mais próximos da vida contemporânea, onde a informação e o conhecimento transformam-se em valores expressivos da sociedade de consumo e de massas. Não devemos esquecer a advertência de Santos: a quem serve esta velocidade? Quem tem o domínio sobre ela? Existe aqui contradição que desejo explorar, sem no entanto, pensar ser possível esgotar a discussão. Existem movimentos e dinâmicas da informação e do conhecimento, existem os sistemas financeiros e econômicos hegemônicos que detém o poder, e portanto a informação e o conhecimento, e ainda podemos identificar na sociedade, os indivíduos/ grupos que imprimem suas marcas no tempo-espaço de suas vivências, construindo conhecimentos e saberes através das informações conquistadas/ processadas/ construídas. Como podemos falar de sistemas auto-organizados emergentes na cidade e na sociedade, se ainda os dilemas urbanos são mediados pelo capital e pelo poder financeiro e econômico? Se descolarmos a apreensão do espaço, quem sabe não poderemos entender os fenômenos de emergência e ‘subordinação’? Mas isto não seria uma mutilação do estudo e da abordagem? Não é disso que estamos fugindo quando evocamos a auto-organização e emergência em sistemas complexos? Não podemos cair na armadilha da simplificação, como forma única da compreensão destes sistemas-complexus.

Diante das dúvidas e até mesmo para permanecer com elas, é interessante que a abordagem possa abrigar a diferença e opacidade, o complexus e as contradições. Nesta via, a multirreferencialidade nos ajuda a caminhar por este emaranhado de informações, conceitos, conhecimentos, espaços, fluxos e cidade. Se pudermos dizer que a multirreferencialidade tem princípios, diríamos que são o da opacidade do objeto e dos múltiplos olhares, não como negação e mutilação de um ante o outro, mas como forma de distinguir e explorar visões outras, que um olhar hierárquico não pode admitir. A nitidez dos contornos e arestas não se apresenta pois, a cada olhar, uma nova relação se estabelece.

Com estas observações vamos tentar encontrar caminhos para o drama exposto acima. Acredito que as instituições hegemônicas exercem seu poder de pressão sobre a sociedade como um todo, mas esta sociedade não absorve os princípios ingenuamente, existe uma retro-alimentação do sistema que modifica a estrutura de poder por meio das micro-apreensões de cada uma das atividades ou a cada re-construção do conhecimento. Esta dinâmica está presente tanto nos softwares inteligentes, nas cidades ou mesmo no cérebro, a diferença é de escala. Mas a proximidade entre os constituintes do sistema permite a criação de uma ‘consciência’ social mais geral.

Os fluxos nas redes geram outros fluxos a partir de suas próprias dinâmicas. O sistema não se resolve, ele terá sempre a dissipação de energia, o que é fundamental para a sua constante instabilidade e mudança.

Acerca das estruturas dissipativas, podemos falar de “auto-organização”. Mesmo que conheçamos o estado inicial do sistema, o processo de que ele é sede e as condições nos limites, não podemos prever qual dos regimes de atividade esse sistema vai escolher. O alcance desta observação impressionou-me. Não podem as bifurcações ajudar-nos a entender a inovação e a diversificação em áreas outras que a física ou a química? Como resistir à tentação de aplicar essas noções a problemas da esfera da biologia, da sociologia ou da economia?[...] (Prigogine, 1996. p.74)

A aplicação de princípios nascidos em outros ramos da ciência é de fato irresistível, o que leva para as possíveis conexões com a natureza. Uma ciência dá suas contribuições, que são apreendidas e ressignificadas por outras, e a partir daí elas começam a ganhar vida, e podem voltar ao seu nascedouro, já modificadas e transformadas, como num processo de contaminação e combate. Dissipação, auto-organização e emergência, princípios para a compreensão do espaço urbano, e neste sentido, a multirreferencialidade muito tem a contribuir:

A multirreferencialidade (...) parte da idéia de que o objeto é efetivamente suscetível de tratamentos múltiplos, em função não só de suas características, mas também dos modos de interrogação dos atores (sobre esse objeto) e que esta multiplicidade é radical. Cada abordagem, cada referente é como se fosse o limite do outro... É isso, pois que faz a especificidade da nultirreferencialidade, e não a complementaridade, a atividade, a pretensão de uma transparência pressuposta, e de um domínio possível (deste objeto), mas a afirmação de uma vazio necessário, da impossibilidade de (se alcançar) um ponto de vista superior a todos (os demais) pontos de vista e a afirmação da limitação recíproca dos diversos campos disciplinares. Há (pois) diversos campos de referência possíveis, nenhum esgota o objeto, nenhum pode, sobretudo, ser reduzido a outro, ou nenhum pode ser explicativo do outro campo. (Berger, apud Fróes Burnham. 1998:46)

A multirreferencialidade pode ser aqui uma base para as abordagens urbanas, e mais uma vez tomamos de assalto um conceito ao nosso favor. O que pretende-se com isso é a criação de possibilidades para os estudos dos espaços urbanos através de uma ciência que evite a mutilação do objeto. Ao chamar a atenção dos aspectos materiais, informacionais e imaginários dos processos urbanos e sociais, quero apenas indicar que o objeto modifica-se e transforma-se em função de nossa aproximação ou de nosso distanciamento. É como nas imagens evocadas por Italo Calvino (no início do texto) para descrever as dunas e as outras conexões estabelecidas a partir de sua forma. Assim, o olhar não vê apenas a areia que substancialmente conforma as dunas, mas faz dela matéria-prima para sua criação, e portanto, com o uso da imaginação, reconstrói e cria espaços e conceitos díspares em relação à matéria original.


ABORDAGEM URBANA

Penso que alguns caminhos foram traçados em busca de possibilidades outras das abordagens urbanas. Não basta que cada ramo da ciência preocupe-se com a ‘fatia’ do mundo que lhes cabe. É preciso fazer com que as ciências interajam em suas pesquisas, só assim, poderemos caminhar para uma maior apropriação do espaço de nossas vidas. As ligações e articulações entre os objetos existem, é preciso não cortá-las. As ciências podem articular seus saberes e entender a sociedade como construção contínua e coletiva. É uma questão de processo, mais que qualquer outra coisa. Processo contínuo, sem uniformidade, com discrepâncias e contradições, onde as múltiplas dinâmicas procuram cada uma, os seus espaços e territórios.

E onde está o conhecimento, a informação e a cidade? O que tem isso com aquilo? Onde está o espaço urbano? E as redes informacionais? E a auto-organização? Essas perguntas eu continuo a fazer e não obtenho respostas. Talvez porque elas não sejam bem formuladas, pois dizem que uma questão bem formulada, certamente obterá êxito em sua busca. E no caso de termos respostas, para elas, perguntas também serão encontradas. Não estou certo, nem convencido de tudo isto. Mas uma coisa parece certa: para uma abordagem consistente do espaço urbano, não basta um estudo minucioso de suas ‘partes’. São necessários diálogos com a questão urbana, e para isso, as pessoas, as ruas, o capital, os lugares e as atividades precisam ‘falar’, precisam de expressão e de espaço para a comunicação nas abordagens e pesquisas. Aqui o conhecimento, a informação e a imaginação têm papel fundamental nas dialogias das dinâmicas urbanas.

Esta questão, pode em princípio parecer simples, pode até já ser uma prática corriqueira em alguns centros de estudos e pesquisas, mas de fato acredito na potencialidade da informação, da imaginação e do conhecimento, na produção e criação de mundos. O espaço de fluxos articula estas funções e grandezas; naqueles, estas se produzem e constituem o lugar fluido das correntes de bits de informação. Daí seguem para a construção de sentidos e portanto, de conhecimento, que por sua vez articula, concentra e dispersa ao mesmo tempo, indivíduos na formação/ geração da própria sociedade. Organismo fluido, com multi-sentidos, repleto de intenções e tensões no seu interior, onde o conhecimento é gerado e ao mesmo tempo gerido, por meio dos sistemas auto-organizados, base da sociedade e de sua mobilidade.

Aprender com os fluxos: o movimento das formigas, das abelhas e das aves, que sem líderes podem ‘polialogar’ através da aproximação e não pelo domínio supostamente exercido por um líder qualquer. Os movimentos emergentes podem ser observados também na apreensão da cidade em várias escalas de aproximação. Faz-se necessário pensar em rede, ter consciência desta condição, que é a mesma do funcionamento de nosso cérebro. De alguma forma as redes de informação no corpo humano funcionam e muito podem ajudar para o entendimento de outros sistemas. É a tentação de que escreve Prigogine, mas é preciso cuidado e rigor. As analogias contribuem para a aproximação e para conectar os objetos-ações, mas é preciso tentar a própria tentação. O pensamento em rede afasta a lógica do menor percurso entre dois pontos – a reta. Não temos dois pontos apenas a conectar. A vida se faz de multipontos e neste caso, Oscar Niemeyer tem muito a nos dizer:

Não é o ângulo reto que me atrai

nem a linha reta, dura, inflexível,

criada pelo homem.

O que me atrai é a curva livre e sensual,

a curva que encontro nas montanhas do meu país,

no curso sinuoso dos seus rios,

nas ondas do mar,

no corpo da mulher preferida.

De curvas é feito todo o universo

o universo curvo de Einstein. (2000. p.17)

Atrair-se pela linha curva: este é o nosso desafio. Os métodos elaborados, os caminhos rígidos e previamente definidos nas pesquisas, os ‘passos a seguir’, a previsibilidade, a monotonia, tudo isso se esvai quando da compreensão dos caminhos múltiplos, da leveza, da materialidade e imaginação do objeto. O inusitado e o inesperado estão nas curvas, onde a trajetória é cambiável, onde não existem impedimentos nem amarras para o percurso. Mais uma vez: informação, conhecimento, cidades e redes – articulações para os espaços urbanos – não são ‘coisas’ dadas, são construídas, forjadas e concebidas, e não o são por heróis ou mentes brilhantes. A produção do conhecimento é algo coletivo, não está totalmente dentro do indivíduo, é preciso provocar, tensionar para que a instabilidade interno-externo faça reagir a capacidade de criar e conectar.

O conhecimento como produto das relações humanas com o mundo-ambiente é fundamental nas articulações dos fluxos no espaço e dos espaços de fluxo. A coisa-informação e a coisa-conhecimento é a coisa-sendo.

Construção, incertezas e inacabamento ...

Deixem-me ficar por estas curva de nossa abordagem.



BIBLIOGRAFIA:

CALVINO, Italo. As cosmicômicas. tradução: Ivo Barroso. São Paulo: Companhia das letras, 1992.

CASTELLS, Manuel. A questão urbana. Tradução: Arlene Caetano. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

CASTORIADIS, Cornelius. Feito e ser feito: as encruzilhadas do labirinto V. tradução: Lílian do Valle. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.

FRÓES BURNHAM, T. Complexidade, multirreferencialidade, subjetividade: três referências polêmicas para e compreensão do currículo escolar. In: BARBOSA, Joaquim Gonçalves. Reflexões em torno da abordagem multirreferencial. São Carlos: EdUFSCar, 1998, pp. 35-55.

JOHNSON, Steven. Emergência: a vida integrada de formigas, cérebros, cidades e softwares. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003.

NIEMEYER, Oscar. Minha arquitetura. 3ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 2000.

PROGOGINE, Ilya. O fim das certezas: tempo, caos e as leis da natureza. tradução: Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1996.

SANTOS, Milton. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico informacional. 4ª ed. São Paulo: Hucitec, 1998.

________. Por uma geografia nova: da crítica da geografia a uma geografia crítica. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002a.

________.Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 9ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2002b.

REDES E HIERARQUIAS URBANAS 2º ano EM

Rede Urbana

A rede urbana é formada pelo sistema de cidades, no território de cada país interligadas umas às outras através dos sistemas de transportes e de comunicações, pelos quais fluem pessoas, mercadorias, informações etc. Obviamente as redes urbanas dos países desenvolvidos são mais densas e articuladas, pois tais países apresentam alto nível de industrialização e de urbanização, economias diversificadas e dinâmicas, vigoroso mercado interno e alta capacidade de consumo. Quanto mais complexa a economia de um país ou de uma região, maior é a sua taxa de urbanização e a quantidade de cidades, mais densa é a sua rede urbana e, portanto, maiores são os fluxos que as interligam. As redes urbanas de muitos países subdesenvolvidos, particularmente daqueles de baixo nível de industrialização e urbanização, são muito desarticuladas, por isso as cidades estão dispersas no território, muitas vezes nem mesmo formando propriamente uma rede.

Assim, As redes das cidades mais densas e articuladas surgem justamente naquelas regiões do planeta onde estão as megalópoles: nordeste e costa oeste dos Estados Unidos, porção ocidental da Europa e sudeste da ilha de Honshu no Japão, embora haja importantes redes em outras regiões do planeta, como aquelas polarizadas pela Cidade do México, por São Paulo, por Buenos Aires e muitas outras de menor importância espalhadas pelo mundo.


Hierarquia Urbana

Desde o final do século XIX, muitos autores passaram a utilizar o conceito de rede urbana para se referir à crescente articulação existente entre as cidades, como resultado da expansão do processo de industrialização ou urbanização, no mesmo período, na tentativa de apreender relações travadas entre as cidades no interior de uma rede, a noção de hierarquia urbana também passou a ser utilizada. O conceito foi tomado do jargão militar, em que há, de fato, uma rígida hierarquia, ou seja, o subordinado tem de se reportar ao seu superior imediato. Assim, por exemplo, no exército, o soldado tem de se reportar ao cabo, que por sua vez tem de se reportar ao sargento, que tem de se reportar ao tenente, capitão etc. sempre num crescendo de poder e de influência, até chegar ao topo máximo da hierarquia, que seria o cargo de general. Desse modo, fazendo uma analogia, a vila seria o soldado e a metrópole completa, o general. Logo a metrópole seria o nível máximo de poder e influência econômica e a vila, o nível mais baixo, e sofreria influência de todas as outras. Desde o final do século XIX até meados da década de 70, foi essa a concepção de hierarquia urbana utilizada. Veja o esquema.

Ocorre que essa concepção tradicional de hierarquia urbana não dá mais conta das relações concretas travadas entre as cidades do interior da rede urbana. Com os crescentes avanços tecnológicos, com a brutal modernização dos sistemas de transportes e de comunicações, com o barateamento e a maior facilidade de obtenção de energia, com a disseminação dos automóveis, enfim, com a "contração" do tempo e o "encurtamento" das distâncias, as relações entre as cidades já não seguem mais o "esquema militar", pelo qual era necessário "galgar" postos dentro da hierarquia das cidades como foi visto acima. Atualmente, já é possível falar da existência de uma nova hierarquia urbana, dentro da qual a relação da vila ou da cidade local pode ser travada com o centro regional, com a metrópole regional ou, em certos níveis, mesmo diretamente com a metrópole nacional.

Assim, é possível uma família morar numa vila (ou bairro) da cidade de Sorocaba (centro regional), que fica aproximadamente a 100 quilômetros de São Paulo, e deslocar-se periodicamente à metrópole paulistana para as compras, ou para o lazer, ou mesmo para trabalhar e, dessa forma, deslocar-se cotidianamente. É possível uma pessoa morar em Araçoiaba da Serra (cidade local) e ter mais vínculos com São Paulo (metrópole nacional) do que com Sorocaba (centro regional). É também plenamente possível uma pessoa residir numa chácara, na zona rural da região de São Roque (cidade local) situada a uns 60 quilômetros de São Paulo e estar totalmente integrada à metrópole, sem Ter necessidade de ir ao centro de São Roque. O que há em comum entre todas essas pessoas é que elas podem dispor de modernas rodovias (Castelo Branco e raposo Tavares) para se deslocar.

Atualmente, uma pessoa pode residir numa chácara ou num sítio, na zona rural, ou numa pequena cidade, lugares distantes de um grande centro, e estar mais integradas do que outra pessoa que resida no interior desse mesmo centro. Se a pessoa vive, por exemplo, numa chácara a quilômetros da grande cidade, mas tem à sua disposição telefone, computador, modem, fax, antena parabólica e um bom automóvel, ela está mais integrada do que a pessoa que mora dentro da cidade, por exemplo, num cortiço ou numa favela, e não tem acesso a todos esses modernos bens e serviços. Percebe-se, portanto, que o que define a integração ou não das pessoas à moderna sociedade capitalista é a maior ou menor disponibilidade de renda e, conseqüentemente, a possibilidade de acesso às novas tecnologias, aos novos conhecimentos, aos novos bens e serviços, e não mais as distâncias que as separam dos lugares.

Essa relativização das distâncias que tem repercussões na rede urbana, também pode ser verificada nas relações capitalistas de produção. Veja o caso da agroindústria do suco de laranja ou de açúcar e álcool do interior do estado de São Paulo. Essas indústrias estão localizadas na zona rural, e no entanto, a mão-de-obra que utilizam, os bóia-frias, vive nas cidades. Além disso, elas dispõem de grandes volumes de capital e produzem para o país inteiro e para o exterior. Tome-se o exemplo da Cutrale, localizada no município de Bebedouro (estado de São Paulo). Praticamente toda a sua produção de suco concentrado está voltada para a exportação e é escoada em caminhões até o porto de Santos, de onde é transportada em navios principalmente para os Estados Unidos. Esta indústria que está na zona rural, relaciona-se com a cidade de Bebedouro contratando trabalhadores, recolhendo impostos etc. e, ao mesmo tempo, com o mundo através de suas exportações.

Nos países desenvolvidos, e mesmo nas regiões industrializados de países subdesenvolvidos, é cada vez mais comum a descentralização das indústrias, instaladas na zona rural, nos eixos de modernas rodovias e ferrovias. Paralelamente, a produção agropecuária foi quase totalmente incorporada pelo capital industrial, pela agroindústria. Tudo isso nos permite concluir que a oposição campo x cidade ou agricultura x indústria já não faz muito sentido na análise geoeconômica dos dias de hoje, notadamente nos países desenvolvidos. A expansão do capital vai envolvendo todas as atividades no processo de modernização, o que acaba levando ao rompimento dessas oposições. Tudo acaba sendo integrado econômica e geograficamente na lógica do lucro, na lógica da reprodução do capital.

VOCÊ PRECISA SABER
• Quais são os fatores que condicionam a urbanização nos países desenvolvidos?
• Quais os principais problemas da urbanização nos países subdesenvolvidos?
• O que você entende por rede e hierarquia urbana?
• Quais as diferenças fundamentais entre a tradicional e a nova hierarquia urbana?
• Por que a clássica oposição campo X cidade e agricultura X indústria já não faz mais sentido atualmente nas regiões mais ricas do planeta?
• O que significa dizer que as distâncias são relativas hoje em dia? Qual é a conseqüência disso na urbanização atual?




• REDE URBANA E A HIERAQUIA DAS GRANDES CIDADES
• Nem todas as cidades tiveram o mesmo desenvolvimento e algumas cidades cresceram em ritmos diferentes do que outras.Esse fenômeno ocorreu não só em termos do aumento da população, mas também em relação à complexidade dos setores secundários e terciários.Com o capitalismo houve uma intensificação das trocas entre as cidades, e as maiores passaram a ter uma crescente influencia sob as menores, chamada de redes urbanas.Essas são mais complexas em áreas com economias mais desenvolvidas, estabelecendo a partir de sua influência econômica, política, social uma hierarquia urbana sob as redes urbanas e cidades mais atrasadas.
• Metrópole mundial ou cidade global – exerce influencia não somente em seu país, mas em todo o mundo.Ex: NY, Tóquio.Alguns autores da geografia consideram cidades globais somente as cidades globais dos países desenvolvidos.Outros incluem como cidades globais cidades localizadas em países em desenvolvimento, como SP.
• Características das cidades globais: pólo tecnológico, centro econômico e financeiro, forte industrialização e desenvolvimento do setor de serviços, com influência global na dinâmica do sistema capitalista globalizado.Outros exemplos: Chicago, Londres, Paris, Zurique (países ricos); SP, Cidade Do México (países em desenvolvimento).
• IMPORTANTE: existe um conceito de mega cidades formulado pela ONU para classificar cidades com mais de 100 milhões de hab, uma cidade global para a ONU pode ou não se confundir com uma mega cidade.Exemplo: Tóquio (mega cidade e cidade global), SP (mega cidade).
• Metrópole nacional – exerce influência em uma determinada região nacional.Ex: SP, RJ, POA, BH.
• Metrópole regional – Vitória, Goiás, Manaus, Caxias do sul.
• Capital regional- serve de pólo para diversos centros regionais menores- pelotas,rio grande
• Centro regional - tem influencia sob cidades menores e vilas- Torres,Gramado
• Megalópoles
• A crescente urbanização gerou um fenômeno conhecido como conurbação,que designa um processo em que duas ou mais cidades passam a constituir uma área entregada,usufruindo serviços de infra-estrutura comum,tornando as áreas urbanas contínuas.As zonas rurais que ficavam nas periferias dessas cidades foram desaparecendo,ocupadas por atividades tipicamente urbanas,diminuindo assim os espaços entre elas.Os limites entre uma e outra passam a ser praticamente imperceptíveis,não se distinguindo onde começa uma e termina a outra,criando-se uma verdadeira união física das cidades.Isso não significa que necessariamente em áreas conurbadas inexistam zonas rurais.Muitas vezes encontramos pequenas zonas agrícolas,quase sempre voltadas para a policultura que tem como destino o abastecimento das próprias cidades.
• O processo de crescimento e expansão das cidades deram origem às metrópoles,cidades interligadas com serviços de infra-estrutura urbana comuns,onde uma delas exerce uma fortíssima influência sobre as outras sendo por isso chamada de cidade central.Essas áreas metropolitanas continuam em expansão,algumas em um ritmo mais acelerado do que outras.Assim, o espaço ocupado pelas áreas metropolitanas muitas vezes acaba decorrendo em um fenômeno que resulta no surgimento das megalópoles,ou seja, na conurbação das metrópoles.
• Exemplos de megalópoles:
• Boswash no nordeste americano estende-se de washiton até Boston,na região dos grandes Lagos.
• Chipitts nos grandes lagos dos EUA tem uma pop.De 50 milhões de hab,de Chicago até Bittsburgh.
• Japonesa- de Tóquio até Nagasáqui,como mais de 100 milhões de hab.
• As cidades tecnopólos – a revolução tecnocientífica (terceira revolução industrial) que marcou o século 20.,Em especial sua segunda metade,trouxe conseqüências também na organização espacial das cidades,dando origem àquelas conhecidas como tecnopólos.Hoje a tecnologia é vital para as relações econômicas.A pesquisa e os institutos de tecnologia de ponta passaram a ser os centros nervosos para a própria dinâmica do mundo capitalista.Nos anos noventa um fenômeno importante marca a transformação de antigos centros universitários de pesquisa avançada passam a ter uma revolução ativa com as empresas de alta tecnologia,como por exemplo,de informática ,telecomunicações e biotecnologia.Esses centros de excelência tornaram-se pólos para a atração de indústrias dessa área.Os tecnopólos normalmente estão situados próximos a grandes centros urbanos.Um dos mais importantes tecnopólos norte-americanos é Boston,Massachusetts,onde estão duas das mais importantes universidades do mundo como Harvard e o MIT.Nessa área alem da indústria bélica,encontramos muitas outras companhias ligadas a outros ramos da tecnologia de ponta.Embora esse tipo de aglomeração seja típico dos países ricos,dado ao volume de investimento e a complexidade da infra-estrutura técnica,países como a índia e a Coréia do Sul vem investindo muito em educação e em pesquisas para desenvolver seus tecnopólos.

Espaço Agropecuário brasileiro 2ª A

Espaço Agropecuário brasileiro
Aspectos da formação do espaço agrário brasileiro
Domingos Nascimento Silva*
Em seu estado da natureza o homem viveu sem organização de relações entre si ou com instituições; com a evolução o homem passou ao estado da sociedade civil, com o estabelecimento de regras de convivência e instituições. A questão da posse e propriedade da terra insere-se nestes estágios evolutivos, sendo que após o período do nomadismo ela passou a ser fator de disputa na fixação em determinada região, e importante para a sobrevivência de civilizações.Os conceitos solo e terra não são iguais. O solo é um corpo natural que resulta da ação de fatores como o clima, os organismos e o tempo, sobre a rocha matriz, em determinada condição de relevo. A interação do solo com o meio que o cerca define a terra; o conceito terra abrange, portanto, não apenas o solo, mas outros elementos como localização, relevo, vegetação, erosão e clima.A atividade agropecuária apresenta peculiaridades em relação às outras atividades econômicas, e em especial em relação à indústria, destacando-se entre elas o fato de que o meio de produção fundamental na agropecuária, a terra, não pode ser multiplicado pelo homem, da maneira como ocorre com as máquinas e outros fatores de produção; devido a isto, a sua apropriação histórica assume uma importância fundamental. Houve um grande desenvolvimento da Agronomia nas últimas décadas, permitindo inclusive que com a hidroponia sejam realizados cultivos em soluções nutritivas, sem o uso do solo; entretanto, o cultivo hidropônico se dá de forma limitada em relação às espécies, estruturas das plantas e resultados econômicos.Este artigo analisa o processo de formação do espaço agrário brasileiro, a partir da descoberta, colonização e ocupação do País, apresentando os principais fatos que nortearam a organização do território. Os fatos mais recentes, ocorridos neste século, já numa perspectiva de correção dos problemas da estrutura agrária formada, também são analisados.A COLONIZAÇÃO E OCUPAÇÃO DO ESPAÇO AGRÁRIO BRASILEIRONa expansão do comércio marítimo de Portugal houve o descobrimento do Brasil, que passou a ser uma importante colônia, contribuindo para a manutenção de Portugal em posição destacada no cenário mercantilista europeu. A fase inicial da colonização brasileira é marcada pela implantação do sistema mercantil, com a existência de relações escravistas, em um País habitado por indígenas em estado primitivo de organização social e produtiva.No período de 1500 a 1530 estabeleceu-se no Brasil a fase de escambo, predominando as atividades extrativistas, principalmente do pau-brasil. As áreas com o pau-brasil eram arrendadas a particulares, com a reserva do monopólio real; este sistema foi substituído pela liberdade comercial e o pagamento de um quinto dos produtos exportados. Com os índios realizava-se a troca do pau-brasil e madeiras finas para marcenaria, que eles forneciam, por objetos como machados, foices, facões, anzóis, pentes e espelhos, de pequeno valor monetário.Seguiu-se à fase de escambo o regime das sesmarias, durante o período de 1530 a 1822. Este regime foi utilizado em Portugal em 1375, a partir de uma crise agrícola, e objetivava o cultivo obrigatório das terras incultas. As sesmarias funcionaram em Portugal, o mesmo não acontecendo no Brasil, em que houve desvirtuamentos, com o benefício de uma minoria e gerando a grande propriedade improdutiva. No Brasil o compromisso de tornar produtivas as grandes áreas recebidas não era cumprido, e a dimensão continental da colônia tornava a fiscalização muito difícil.O rei de Portugal instituiu o sistema de capitanias hereditárias para o Brasil, em 1534, com a divisão da colônia em quinze lotes, que foram distribuídos entre doze donatários, que tinham poderes para conceder terras como melhor lhes convinham, apenas recolhendo o dízimo à Ordem de Cristo, que era administrada pelo rei de Portugal. Houve prosperidade em apenas duas capitanias hereditárias, as de São Vicente e de Pernambuco, com os comandos de, respectivamente, Martim Afonso de Souza e Duarte Coelho; favorecidas com o desenvolvimento da lavoura canavieira, a paz com os indígenas, e a excelente administração, incluindo o recebimento de investimentos de capital europeu. Com o fracasso do sistema de capitanias hereditárias, o rei de Portugal, buscando impulsionar a colonização, criou o Governo-Geral, que funcionaria como um órgão de coordenação das capitanias hereditárias; não se verificou mudanças significativas no sistema de distribuição das terras.Verificou-se durante o regime das sesmarias no Brasil o desenvolvimento do sistema de posses, em função de necessidades econômicas e sociais. Este sistema não tinha amparo legal, e envolvia inicialmente populações pobres; entretanto, com o fim do regime das sesmarias, que ocorreu a partir do fim do período colonial, este sistema passou a abranger grandes áreas de terra.
Prado Júnior (1987) observa que o acentuado grau de concentração fundiária no Brasil resulta da natureza da economia constituída com a colonização e ocupação progressiva do território, baseada na grande propriedade e no estabelecimento de atividades mercantis. A colônia deveria cumprir o papel de fornecer em larga escala produtos primários aos mercados europeus.Em INCRA (1987) é assinalado que não existe um levantamento completo das doações de terras ocorridas no período das sesmarias no Brasil. Para o Estado da Bahia, é mencionada nesta publicação, como a mais importante doação, a concedida ao armador-mor D. Álvaro da Costa, denominada de capitania de Peroaçu, envolvendo todo o território entre as barras do Paraguaçu e o Jaguaribe. É citada ainda como importante, a doação da Ilha de Itaparica, ao Conde de Castanheira. Também é observado que a pecuária acentuou a tendência à formação de imensas propriedades e a sua concentração nas mãos de poucas pessoas; com o extenso sertão baiano, nos séculos XVI e XVII, estando sob o domínio de apenas duas famílias, a Casa da Torre e os Guedes de Brito.
A agricultura de subsistência enfrentou muitas dificuldades no processo de colonização e ocupação do território brasileiro, mas se tornou, com o decorrer dos séculos, em importante atividade para parcela significativa da população rural. A agricultura de subsistência desenvolveu-se nas grandes áreas das monoculturas e da pecuária extensiva, e também em unidades pequenas, em que o proprietário ou o ocupante trabalhavam diretamente a terra, normalmente em áreas de qualidade inferior e distante dos centros urbanos.Sodero (1982) observa que o Estatuto da Terra, e o Direito Agrário brasileiro, fundamentam-se na doutrina da função social da propriedade, segundo a qual toda a riqueza produtiva tem uma finalidade social e econômica, e aquele que a detém deve fazê-la frutificar, em benefício próprio e da comunidade em que vive. A terra rural, portanto, não é um direito individualista, devendo gerar produtos agropecuários, agro-industriais e empregos, preservando o equilíbrio ecológico.Esta doutrina, anteriormente um princípio, não é recente no mundo, tendo sido exposto inicialmente, de forma simples, na antigüidade grega por Aristóteles, e já no século XIII estas idéias iniciais foram cristianizadas por Santo Tomás de Aquino, com a afirmação de que "cada coisa alcança sua colocação ótima, quando é ordenada para seu próprio fim''. Entretanto, estes fundamentos foram pouco usados no decorrer dos séculos anteriores ao atual, apesar de serem até lembrados em algumas ocasiões, como por exemplo na concessão das sesmarias no Brasil, em que fora estabelecido que se destinassem áreas de terras que um homem pudesse explorar com os recursos disponíveis, e determinado um tempo para que isto efetivamente ocorresse, caso contrário a doação seria cancelada; observa-se aí a busca do cumprimento da função social da propriedade, que infelizmente não chegou a existir na acepção da expressão.Na Constituição brasileira de 1934 é introduzida a doutrina da função social da propriedade, um pouco tardiamente pois outras cartas magnas da América Latina já a haviam adotada desde 1919.O Estatuto da Terra, Lei n° 4.504, de 30 de novembro de 1964, apresenta os fundamentos da área agrária no Brasil. Vários países da América Latina haviam se comprometido na Conferência de Punta del Este, em 1960, a realizar a Reforma Agrária, entre eles o Brasil. Havia no País uma mobilização intensa de trabalhadores rurais reivindicando a realização da Reforma Agrária. O Governo do Marechal Castelo Branco criou um grupo de trabalho em 1964, que elaborou o Estatuto da Terra, que não se limitou à Reforma Agrária, abrangendo a área de desenvolvimento rural. Esperava-se ações significativas para resolver o problema da desigualdade da distribuição das terras, mas as ações voltaram-se para as áreas cadastral, tributária e de colonização, e de modernização da agropecuária, esta ocorrendo nas grandes e médias propriedades.Sobre a doutrina da função social da propriedade, o Estatuto da Terra estabelece no seu artigo segundo que:A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente:a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias;b) mantém níveis satisfatórios de produtividade;c) assegura a conservação dos recursos naturais;d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivam.Verifica-se que o cumprimento da função social presente no Estatuto da Terra, e nas demais legislações da área agrária, abrange aspectos da produção da atividade, da conservação e preservação do meio ambiente, e das relações de trabalho e de convivência entre as pessoas no imóvel rural.A Constituição brasileira de 1988 dedica o Capítulo III, do Título VII, à Política Agrícola e Fundiária e à Reforma Agrária. Entretanto, as ações na área agrária tiveram dificuldades de implementação, só reduzidas com a aprovação da Lei n 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, que regulamentou disposições sobre a Reforma Agrária contidas neste Capítulo; e as aprovações que se seguiram de outras legislações.No início da década de oitenta havia uma mobilização de trabalhadores rurais no Brasil, reivindicando a realização da Reforma Agrária; a luta dos trabalhadores rurais nesta época contribuiu para a formulação do I Plano Nacional de Reforma Agrária PNRA, aprovado pelo Governo Federal em outubro de 1985. Entretanto as ações de Reforma Agrária com o IPNRA foram pequenas. Apenas a partir de 1995 é que se inicia no Brasil um programa de distribuição de terras que pode ser considerado, ao mesmo tempo, significativo, relativamente ao que foi feito historicamente, mas ainda pequeno, considerando a dimensão do problema agrário do País. Deve-se ressaltar que o conceito Reforma Agrária abrange um conjunto de medidas, incluindo o acesso dos trabalhadores rurais à terra, e outras que permitam o desenvolvimento local e regional.Durante o processo de colonização e ocupação do território brasileiro não houve mecanismos para impedir a concentração de terras, nem o País realizou a Reforma Agrária para corrigir as distorções formadas nesta área. Com o argumento da superioridade tecnológica da grande produção capitalista e da sua capacidade de atender eficientemente a toda demanda de alimentos e matérias primas agrícolas, questiona-se nas discussões atuais que o Brasil teria perdido a oportunidade histórica de realizar a Reforma Agrária. Entretanto, o País apresenta o recurso terra em abundância, cujo acesso deve ser democratizado, resolvendo um processo histórico de concentração. A grande atividade agropecuária, com o uso de tecnologia avançada, não é a única via a ser percorrida, inclusive porque os aspectos de viabilidade econômica, sustentabilidade ambiental e impacto social, devem ser considerados conjuntamente, não se enfatizando alguns aspectos e desconsiderando outros. A pequena produção deve ser apoiada, com o agricultor utilizando tecnologias apropriadas, e passando por um processo de crescimento técnico, econômico e social.O Brasil apresenta uma distribuição desigual do recurso terra, fato evidenciado em pesquisas realizadas sobre o tema. Tal questão não é recente, e resulta do processo de colonização e ocupação do território, tendo sido analisado neste artigo. O programa de Reforma Agrária em execução no Brasil tem permitido para muitos trabalhadores rurais o acesso à terra. Possibilitar aos assentamentos de Reforma Agrária criados, a viabilidade econômica, social e ambiental, é fundamental, atingindo com isto os objetivos da Reforma Agrária, e impedindo que ocorram processos de reconcentração no espaço agrário do País.
Postado por professora de geografia às 14:47
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O espaço Industrial brasileiro
O espaço industrial brasileiroCONCENTRAÇÃO E DESCONCENTRAÇÃO INDUSTRIAL Os processos de industrialização promovem, sempre, a concentração espacial da riqueza e dos recursos financeiros e produtivos. Essa tendência de concentração espacial acompanhou a industrialização brasileira, desde o início do século XX. Em escala nacional, o seu resultado foi a configuração, no Sudeste, de uma região industrial central, dinâmica e integrada. O núcleo dessa região corresponde ao Estado de São Paulo. Além da dinâmica da economia de mercado, a geografia industrial depende das estratégias do Estado. Entre as décadas de 1940 e 1960, a política estatal de desenvolvimento da grande siderurgia abriu uma nova etapa da industrialização brasileira, reforçando a tendência de concentração espacial da indústria no Sudeste. A grande siderurgia brasileira nasceu a partir de duas empresas estatais: a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). A segunda encarregou-se da extração, do transporte ferroviário e naval e da comercialização dos minérios do Quadrilátero Ferrífero, antes de expandir as suas atividades para inúmeras outras jazidas do País. O Estado de São Paulo, núcleo industrial mais dinâmico do Centro-Sul, não está em declínio industrial. As fábricas baseadas no uso intensivo de mão-de-obra são repelidas para outras localizações, mas os principais investimentos em indústrias de alta tecnologia continuam a ser atraídos por São Paulo. A redução da participação do Estado no emprego não é acompanhada por uma diminuição tão acentuada no valor da produção industrial. A SUDENE E A INDUSTRIALIZAÇÃO DO NORDESTE

A industrialização moderna do Nordeste associou-se a uma fase do modelo de substituição de importações marcada pela importância das políticas de desenvolvimento regional do Estado. Essas políticas conduziram a processos de desconcentração da indústria, em escala nacional, e de concentração industrial, em escala regional. A criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), em 1960, foi o ponto de partida de um projeto de desconcentração industrial baseado no planejamento estatal. Por meio de um vasto programa de incentivos fiscais, o Estado conseguiu direcionar investimentos privados do Centro-Sul para o Nordeste. A implantação de usinas hidrelétricas de porte no Rio São Francisco e a presença de mão-de-obra abundante e barata funcionaram como incentivos suplementares.Na Bahia, essa estratégia conduziu à criação do pólo petroquímico de Camaçari e do distrito industrial de Aratu, ambos na região metropolitana de Salvador, O pólo de Camaçari, estabelecido na década de 1970, gira em tomo da Refinaria Landulfo Alves, da Petrobras. O parque industrial químico representou alteração estrutural na economia baiana, tornando-se logo a principal fonte de receita tributária do Estado. No distrito de Aratu predominam as indústrias de bens de consumo duráveis atraídas pelos incentivos da Sudene. O impulso promovido pela Sudene gerou também pólos de produção de bens intermediários como as indústrias de fertilizantes de Sergipe e o complexo químico Salgema de Alagoas. Os insumos produzidos por esses pólos são, em geral, transformados no Sudeste e, em especial, no Estado de São Paulo.

Os Circuitos da Produção (2ª A)

Os Circuitos da Produção (2ª A)
Produção do espaço, sistemas técnicos e divisão territorial do trabalho (Resumo)
Como a produção do espaço resulta do trabalho social que se funda no sistema técnico imperante em cada fase da história., o conjunto das tarefas executadas pela sociedade reflete a correlação entre espaço produzido e as técnicas disponíveis em determinada época, também chamada de ciclo. O Brasil nasceu na região do nordeste atual, do litoral (com a cana) ao interior ou o amplo sertão nordestino, com a pecuária. Neste, sucederam do séc. XVII ao XXI vários sistemas técnicos caracterizantes da pecuária, cotonicultura, extrativismo, agroindústria e turismo. Cada um com suas especificidades de trabalho. Tomamos, como referência territorial, uma parte de uma das unidades político-adiministrativas, o estado do Ceará no Nordeste Oriental, cujo trabalho sempre esteve ligado, direta ou indiretamente, à ordem internacional, quer da metrópole (Portugal) quer de outros mercados1.
Palavras-chave: sistemas técnicos, pecuária, atividades extrativas, agro-indústria e turismo.
O espaço, como produto do trabalho social, estabelece a condição de continuidade da sociedade, pois cada nova geração sobrevive utilizando-se dos objetos do passado, superpondo-lhes ou acrescentando-lhes outras criações. O geógrafo Allen Scott (1988) diz que "sob as pressões da acumulação, o mundo social está continuamente sendo transformado e retransformado". Com o tempo, o espaço se complexifica e, com as novas condições de comunicabilidade entre os grupos sociais, o espaço ultrapassa o local, tornando-se universal.
As técnicas de uma época estão no espaço produzido. O tempo está, assim, no espaço. Neste, o tempo se denuncia pela presença de diferentes modos de produção. Daí Santos (1980, p.163) dizer que "cada vez que o uso social do tempo muda, a organização do espaço muda igualmente. De um estágio da produção a um outro, de um comando do tempo a um outro, de uma organização do espaço a uma outra, o homem está cada dia e permanentemente escrevendo sua História, que é ao mesmo tempo a história do trabalho produtivo e a história do espaço."
No capitalismo, essas exigências de fazer e refazer formas assumem um caráter cíclico. Harvey (citado por Soja, 1993) sintetizou esse caráter do sistema: "as contradições internas do capitalismo expressam-se através da formação e re-formação irrequietas das paisagens geográficas. É de acordo com essa música que a geografia histórica do capitalismo tem que dançar, ininterruptamente"
Essa afirmação de David Harvey nos leva ao tema dos ciclos, debatidos e teorizados por pensadores de diferentes posturas ideológicas 2, como a teoria dos ciclos longos ou das ondas de Kondratieff.
Nesse corpo teórico, a análise ultrapassa os limites da economia, porquanto vê o sistema em sua totalidade, incluindo "componentes tecnológicos e sociais em interação com o subsistema econômico (Perez) ou, como nos diz o economista brasileiro Ignácio Rangel: "os ciclos econômicos não são apenas fatos econômicos. São fatos sociais, no mais alto sentido dessa expressão" (Folha de São Paulo, 04/08/88). Se são fatos sociais, exprimem-se nas feições da "segunda natureza".
Esses ciclos estão relacionados com as mudanças tecno-econômicas e sócio-institucionais. À medida que elas apresentam uma sintonia há uma tendência de refazer-se da crise e o sistema toma impulso, fase em que se propõe chamar de fase "A". Quando o sistema capitalismo entra em crise, com o desajuste dos dois subsistemas (tecno-econômico e sócio-institucional), entra na depressão ou fase "B".
Desde o século XVIII que, com o controle e a condensação do conhecimento tecnológico transformado em técnica, o capitalismo reedifica-se e solidifica-se, embora dentro das contradições que lhe são inerentes. Os grandes períodos, grandes ciclos ou ondas longas, de duração entre 50 e 60 anos, são marcados por determinados conjuntos de descobertas, de inovações conjugadas que estabelecem uma nova forma de produção e de consumo, possibilitando uma outra dinâmica à vida global da sociedade, afeiçoando-a a um outro paradigma. Dessa maneira, mudam-se as funções, ressurgem formas novas para melhor atender a reanimação dos fluxos de que resulta a produção de um novo espaço, o espaço da modernidade de então. É porisso que podemos falar do espaço de uma determinada época, de novas funções das formas ressurgentes, de "rugosidades"3, de reestruturação do sistema da renovação do espaço geográfico e de inovação da modalidades e das formas de relações de trabalho.
Na compreensão do economista europeu Joseph Schumpeter (1883-1950), essa fluidez do sistema em, periodicamente, apresentar rupturas e posterior ajustamento deve-se à sua dinâmica basear-se na vaga contínua de destruição criativa. Essa idéia se fundamenta na ação dos empresários inovadores que, diante da crise, assimilam a nova ordem técnica e adotam métodos capazes de produzir a custo menor. A base do contexto capitalista está na "abertura de novos mercados, externos ou internos, e o progresso de organização desde o artesanato até a indústria que, incessantemente, revoluciona a estrutura econômica, destruindo incessantemente a antiga e incessantemente criando uma nova. Este processo de destruição criativa é o fato essencial do capitalismo" (Schumpeter,1946, p.103-4).
Para Soja (1993), "a reestruturação, em seu sentido mais amplo, transmite a noção de uma ruptura nas tendências seculares, e de uma mudança em direção a uma ordem e uma configuração significativamente diferentes da vida social, econômica e política. Evoca, pois, uma combinação seqüencial de desmoronamento e reconstrução, de desconstrução e tentativa de reconstituição..." (p. 193). O espaço é a expressão mais significante dessa mudança. Nesse aspecto, a cidade é o lugar de maior demonstração do espaço reconstruído e criador de extensores capazes de vincular diferentes pontos, proporcionando a abertura de novos mercados que oferecem meios para a nova ordem que se constrói. Dela partem as ordens, as informações e as comunicações que definem as modalidades de uso dos territórios, da organização da produção e de forma de existência do homem.
Embora esse norteamento teórico esteja mais intimamente relacionado ao conjunto global do sistema capitalista, essa reflexão nos leva a compreender porque subespaços também passam por ciclos. Isso ocorre, especialmente, quando notamos a inserção econômica e produtiva desses subespaços. Isto se faz quando esses pedaços de espaço recebem ordens externas, como sempre tem sido o caso do nordeste brasileiro.